O conflito Israel-Gaza, que se arrasta há décadas, mas que se intensificou dramaticamente desde o ataque do Hamas em 7 de outubro de 2023, continua a ser um dos mais complexos desafios geopolíticos do Médio Oriente. Os recentes ataques aéreos israelenses, como os registados na madrugada de 18 de Abril de 2025, que resultaram na morte de pelo menos 17 civis, incluindo mulheres e crianças, em áreas densamente povoadas como Jabaliya e Khan Younis, evidenciam a persistência de uma abordagem militar que, embora justificada por Israel como resposta à ameaça do Hamas, tem gerado um custo humanitário devastador. Paralelamente, a nomeação de Mike Huckabee como embaixador dos Estados Unidos em Israel e a sua primeira aparição pública, depositando uma oração escrita pelo presidente Donald Trump no Muro das Lamentações, sinalizam a continuidade de uma política externa americana fortemente alinhada com os interesses israelenses. Este artigo analisa as implicações desta postura no contexto do conflito e da diplomacia internacional.
O Contexto do Conflito e os Ataques Recentes
Os ataques aéreos de 18 de Abril, que atingiram Jabaliya e Khan Younis, inserem-se numa ofensiva israelense que, segundo o governo de Benjamin Netanyahu, visa neutralizar infraestruturas do Hamas e lideranças do grupo. Contudo, os relatos de vítimas civis, corroborados por fontes como a Defesa Civil de Gaza, controlada pelo Hamas, sublinham a dificuldade de conciliar objetivos militares com a proteção de populações vulneráveis. Desde outubro de 2023, mais de 48.500 palestinianos, a maioria civis, perderam a vida, enquanto 70% das infraestruturas de Gaza foram danificadas ou destruídas, segundo o Ministério da Saúde local. Estes números, embora utilizados pela ONU, refletem a narrativa de um conflito assimétrico, onde a superioridade militar de Israel contrasta com a precariedade humanitária em Gaza.
O Hamas, por sua vez, mantém reféns capturados em 2023, com 58 ainda retidos, dos quais 34 são considerados mortos pelo exército israelense. A rejeição de propostas de trégua, como a recente oferta de Israel que incluía a libertação de 10 reféns em troca de uma pausa de 45 dias e ajuda humanitária, demonstra a inflexibilidade de ambas as partes. Este impasse agrava a crise humanitária e dificulta esforços de mediação.
A Diplomacia Americana e o Papel de Mike Huckabee
A nomeação de Mike Huckabee como embaixador dos EUA em Israel, um cristão evangélico com posições pró-Israel marcadamente conservadoras, reflete a orientação da administração Trump. Huckabee, que rejeita publicamente a ideia de um Estado palestiniano, contradiz décadas de política externa americana centrada na solução de dois Estados. A sua declaração de que “os palestinianos tiveram a sua chance em Gaza” ignora a complexidade histórica da ocupação israelense desde 1967 e desvaloriza as aspirações legítimas do povo palestiniano. A sua aparição no Muro das Lamentações, depositando uma oração de Trump que reitera o apoio à libertação dos reféns, é um gesto simbólico que reforça a aliança incondicional entre Washington e Telavive.
A política de Trump, que inclui a reversão da suspensão de fornecimento de armas a Israel ordenada por Joe Biden, demonstra um compromisso com a supremacia militar israelense. Contudo, esta abordagem tem sido criticada por desconsiderar o impacto humanitário dos bombardeamentos e por minar a credibilidade dos EUA como mediador imparcial. A proposta de Trump de transferir temporariamente palestinianos de Gaza para o Egito e a Jordânia, rejeitada veementemente por líderes palestinianos e países árabes, revela uma visão desconectada da realidade regional, onde o deslocamento forçado é visto como uma violação do direito internacional e uma ameaça à identidade palestiniana.
Implicações Regionais e Internacionais
O alinhamento incondicional dos EUA com Israel tem consequências significativas. Primeiro, enfraquece a posição de Washington como mediador, especialmente num momento em que países como o Catar e o Egito tentam, sem sucesso, negociar tréguas duradouras. Segundo, alimenta tensões com outros atores regionais, como o Irã, que condena a “cumplicidade” americana nos ataques israelenses, e com aliados tradicionais como a Arábia Saudita e o Catar, que criticaram os bombardeamentos em áreas civis. Terceiro, a retórica de Huckabee e Trump, que ignora a solução de dois Estados, aliena a comunidade internacional, incluindo a União Europeia, que continua a defender a coexistência de Israel e Palestina.
Além disso, a escalada do conflito ameaça desestabilizar a região. O Hezbollah, apoiado pelo Irã, intensificou ataques a partir do Líbano, enquanto os Houthis no Iémen e milícias no Iraque sinalizam solidariedade com Gaza. Este “Eixo da Resistência” aumenta o risco de um confronto regional mais amplo, que os EUA, apesar do seu poderio militar, podem ter dificuldade em conter.
Uma Crítica à Estratégia Americana
A diplomacia americana, sob Trump, parece guiada mais por considerações ideológicas e eleitorais do que por uma visão estratégica de longo prazo. O apoio incondicional a Israel, embora reforçado por laços históricos e pela influência do lobby pró-Israel nos EUA, negligencia a necessidade de abordar as causas estruturais do conflito, como a ocupação, o bloqueio de Gaza e a expansão de colonatos na Cisjordânia. A nomeação de Huckabee, cuja visão nega a legitimidade de um Estado palestiniano, é um retrocesso em relação aos esforços de administrações anteriores, que, ainda que imperfeitamente, buscaram equilibrar apoio a Israel com pressão por negociações.
Para que os EUA recuperem credibilidade como mediadores, seria necessário adotar uma postura mais equilibrada, que reconheça as aspirações palestinianas e pressione Israel a cumprir obrigações humanitárias e legais. A insistência em soluções unilaterais, como a transferência de populações ou a negação de um Estado palestiniano, apenas perpetua o ciclo de violência e alienação.
Conclusão
O conflito Israel-Gaza, exacerbado pelos recentes ataques aéreos e pela postura inflexível de ambas as partes, exige uma abordagem diplomática que transcenda alinhamentos ideológicos. A administração Trump, através de figuras como Mike Huckabee, opta por reforçar a aliança com Israel, mas a custo de agravar tensões regionais e de comprometer a sua influência como mediador. A tragédia humanitária em Gaza, com milhares de civis mortos e infraestruturas destruídas, não pode ser resolvida apenas com força militar ou gestos simbólicos. Uma solução duradoura requer diálogo, compromisso com o direito internacional e o reconhecimento das aspirações de ambos os povos. Enquanto os EUA não assumirem este papel com imparcialidade, o Médio Oriente continuará refém de um conflito sem fim previsível.
O conteúdo Conflito Israel-Gaza e a diplomacia dos EUA: uma análise crítica aparece primeiro em Correio da Kianda – Notícias de Angola.
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