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O desfile do Dia da Vitória em Moscovo: uma análise geopolítica e geoestratégica

O Desfile do Dia da Vitória de 2025, a ser realizado hoje, na Praça Vermelha, em Moscovo, sob a presidência de Vladimir Putin, consolidou-se como um evento de profunda relevância geopolítica, transcendendo seu significado histórico de comemoração dos 80 anos da vitória soviética sobre a Alemanha nazista na Segunda Guerra Mundial. A presença de 29 líderes mundiais, incluindo figuras como o presidente chinês Xi Jinping, o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente venezuelano Nicolás Maduro e líderes de nações africanas e do Oriente Médio, reforça a narrativa de Putin como um líder global capaz de contrabalançar a influência ocidental.

O Desfile do Dia da Vitória, que é tradicionalmente um símbolo do patriotismo russo, foi transformado por Putin numa plataforma para projectar poder e desafiar a narrativa de isolamento imposta pelo Ocidente após a invasão da Ucrânia em 2022. A presença de 29 líderes mundiais, conforme anunciado pelo Kremlin, representa um aumento significativo em relação aos anos anteriores (nove em 2024, sete em 2023), sinalizando uma recuperação da influência russa em regiões como Ásia, África e América Latina. A participação de Xi Jinping, descrito como o “convidado de honra”, sublinha a consolidação da parceria sino-russa, que visa contrapor o “unilateralismo” ocidental, particularmente dos EUA sob a administração Trump.

O evento ocorre num momento de tensões globais exacerbadas. A guerra na Ucrânia continua, com Putin propondo um cessar-fogo de três dias para o desfile, rejeitado por Volodymyr Zelensky como uma “performance teatral”. Ataques de drones ucranianos em Moscou nos dias 4 e 5 de maio alimentaram temores de interrupções, levando a medidas de segurança sem precedentes. Além disso, a crise entre Índia e Paquistão, agravada pelo ataque terrorista em Pahalgam e pela suspensão do Tratado das Águas do Indo, adiciona uma camada de complexidade, especialmente porque a ausência do primeiro-ministro indiano Narendra Modi no desfile foi notada, sugerindo prioridades regionais mais urgentes.

A Rússia no Panorama Internacional

A Rússia, apesar das sanções ocidentais e da condenação pela guerra na Ucrânia, mantém uma posição estratégica no sistema internacional, alavancando recursos energéticos, parcerias com potências emergentes e sua condição de potência nuclear. O Desfile do Dia da Vitória de 2025 foi uma oportunidade para Putin reforçar a narrativa de que a Rússia não está isolada, mas sim lidera um bloco de nações que resistem à hegemonia ocidental. A presença de líderes de países do BRICS, como Brasil e China, e de nações africanas e do Oriente Médio, reflete o sucesso relativo de Moscou em cultivar alianças no Sul Global.

No entanto, a ausência de líderes ocidentais, como o britânico Keir Starmer, e a participação limitada de figuras europeias, com exceção do primeiro-ministro eslovaco Robert Fico, destacam a polarização entre a Rússia e o Ocidente. A advertência da alta representante da UE, Kaja Kallas, contra a participação de líderes europeus no desfile, reforça a pressão sobre países como a Sérvia, candidata à UE, que enfrentam dilemas entre alinhamento com Bruxelas e laços históricos com Moscou.

Impacto no Contexto Índia-Paquistão

A crise entre Índia e Paquistão, em seu ápice em maio de 2025, influencia indiretamente o desfile. A ausência de Modi, que havia sido convidado por Putin, reflete a necessidade de a Índia concentrar-se na gestão da escalada com o Paquistão, que inclui confrontos na Linha de Controlo e manipulações das águas do Indo. A Rússia, que mantém relações cordiais com ambos os países, enfrenta o desafio de equilibrar sua parceria estratégica com a Índia (membro do BRICS e comprador de armamento russo) e suas relações com o Paquistão, aliado da China. A presença de Xi Jinping no desfile, mas não de Modi, pode ser interpretada como um sinal de que a crise regional está limitando a capacidade da Índia de participar de eventos globais de alto perfil, enquanto a China capitaliza a oportunidade para reforçar sua liderança no eixo antiocidental.

Pontos Positivos do Evento

1. Projeção de Unidade: A presença de 29 líderes, incluindo figuras de peso como Xi e Lula, fortalece a imagem de Putin como um líder global, desafiando a narrativa de isolamento.
2. Fortalecimento do Eixo Sino-Russo: A visita de Xi Jinping consolida a parceria estratégica entre Moscou e Pequim, com potencial para aprofundar a cooperação económica e militar, especialmente em resposta às tarifas de Trump.
3. Diplomacia do Sul Global: A participação de líderes africanos, latino-americanos e do Oriente Médio reforça a influência russa em regiões onde o Ocidente enfrenta resistência, promovendo uma ordem multipolar.
4. Simbolismo Histórico: O desfile reafirma a memória da vitória na Segunda Guerra Mundial, um ponto de orgulho nacional que ressoa tanto na Rússia quanto em países aliados, como a China, que sofreu perdas massivas na guerra contra o Japão.

Desafios e Riscos

1. Polarização Global: A ausência de líderes ocidentais e a crítica de Kallas sublinham a divisão entre a Rússia e o Ocidente, dificultando esforços de mediação na Ucrânia e em outras crises, como a Índia-Paquistão.
2. Risco de Escalada com a Ucrânia: As provocações de Zelensky, incluindo ataques de drones, e sua recusa do cessar-fogo sugerem que a Ucrânia pode intensificar ações durante o desfile, comprometendo a segurança e a mensagem de força de Putin.
3. Limitações Diplomáticas: A presença de líderes de regimes autoritários, como Maduro e Lukashenko, reforça a percepção de que a Rússia está alinhada principalmente com ditaduras, o que pode alienar nações mais neutras.
4. Impacto Regional na Ásia: A ausência de Modi e a crise Índia-Paquistão destacam os limites da influência russa em mediar conflitos regionais, especialmente quando envolvem aliados estratégicos como a Índia e parceiros da China, como o Paquistão.

Conclusão

O Desfile do Dia da Vitória de 2025 foi uma demonstração cuidadosamente orquestrada do poder e da resiliência da Rússia num mundo multipolar. A presença de 29 líderes mundiais, liderados por Xi Jinping, reforçou a narrativa de Putin como um contrapeso ao Ocidente, enquanto a ausência de Modi refletiu as tensões regionais que limitam a participação de aliados-chave. Para Angola, que mantém relações com a Rússia e a Índia, o evento sublinha a importância de uma diplomacia pragmática que equilibre interesses regionais e globais. No entanto, os desafios desde a polarização global até os riscos de escalada com a Ucrânia e as tensões Índia-Paquistão exigem que a Rússia navegue com cautela para transformar o simbolismo do desfile em ganhos estratégicos concretos. A comunidade internacional, por sua vez, deve permanecer vigilante, promovendo diálogo para evitar que eventos como este alimentem novas divisões ou conflitos.

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