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A vitória do Partido Liberal no Canadá em 2025 e os desafios futuros

A vitória do Partido Liberal do Canadá nas eleições federais de ontem, sob a liderança de Mark Carney, representa uma viragem política sem precedentes, moldada por factores exógenos como as tarifas punitivas anunciadas por Donald Trump e endógenos, como a transição de liderança resultante da renúncia de Justin Trudeau. Este ensaio analítico examina, com base em dados credíveis e sob uma perspectiva crítica, os factores determinantes da vitória liberal, os desafios internos e externos que se colocam ao novo executivo, bem como as implicações geopolíticas para o Canadá e para a América do Norte.

Factores que Conduziram à Vitória Liberal

As eleições de 2025 desenrolaram-se num cenário de elevada volatilidade política. Em Janeiro do mesmo ano, os conservadores liderados por Pierre Poilievre registavam uma vantagem significativa nas sondagens (20 a 27 pontos percentuais), alicerçada na crescente impopularidade de Trudeau, no descontentamento com a política fiscal do carbono e nas pressões inflacionistas. No entanto, dois acontecimentos alteraram o rumo dos acontecimentos: a demissão de Trudeau a 6 de Janeiro, sob pressão interna de 21 deputados liberais após a saída da Ministra das Finanças, Chrystia Freeland; e as declarações de Donald Trump, que ameaçou aplicar tarifas de 25% sobre produtos canadianos, num tom de hostilidade que insinuou mesmo a transformação do Canadá no “51.º Estado”.

A eleição de Mark Carney, economista de renome internacional e antigo Governador do Banco do Canadá e do Banco de Inglaterra, para a liderança liberal a 9 de Março (com 85,9% dos votos), permitiu ao partido reconfigurar a sua imagem. Posicionado como tecnocrata independente da gestão Trudeau, Carney aproveitou o fervor nacionalista desencadeado pelas provocações norte-americanas e convocou eleições antecipadas. As sondagens da YouGov projectaram uma maioria confortável, que se concretizou com 182 dos 343 lugares parlamentares.

O colapso do Novo Partido Democrático (NDP), cuja quota eleitoral caiu 12 pontos percentuais, e a transferência de mandatos do Bloco Quebequense para os liberais foram determinantes. A derrota dos líderes conservador e do NDP nas suas próprias circunscrições, contrastando com a eleição de Carney em Nepean, solidificou a legitimidade política do novo primeiro-ministro.

Desafios Internos

1. Pressões Económicas e Comerciais
Carney terá como prioridade renegociar com a administração Trump, dado que cerca de 70% das exportações canadianas têm como destino os Estados Unidos. Propôs um pacote de estímulo à diversificação económica no valor de 5 mil milhões de dólares e 2 mil milhões para protecção do sector automóvel. Contudo, os impactos inflacionários das tarifas poderão comprometer os esforços, sobretudo face à inflação já fixada em 2,7%. A promessa de isenção fiscal parcial para aquisição da primeira habitação até 1 milhão de dólares enfrenta obstáculos financeiros e logísticos.
2. Fracturas Regionais e Desigualdades Federativas

A exclusão quase total dos liberais em Alberta e Saskatchewan províncias produtoras de petróleo representa uma ameaça à coesão federativa. A percepção de marginalização por parte do governo central pode exacerbar o sentimento de alienação nestas regiões, agravado por políticas climáticas impopulares.

3. Desgaste do Poder
Após uma década de governação liberal, Mark Carney procura reposicionar o partido, reduzindo o número de ministros e afastando-se de agendas progressistas identitárias. No entanto, a continuidade estrutural da governação pode comprometer a renovação esperada pelo eleitorado, afectando o capital político necessário para o início do mandato.

4. Sustentação da Base Progressista
A migração do eleitorado progressista do NDP para os liberais foi decisiva, mas poderá ser insustentável se Carney prosseguir com uma linha tecnocrática e economicista. A polémica declaração no debate em francês, onde acidentalmente declarou “concordamos com o Hamas”, embora posteriormente esclarecida, poderá minar o apoio de sectores pró-palestinianos e acirrar tensões na política externa.

Desafios Externos

1. Relações com os Estados Unidos da América
O proteccionismo de Trump representa uma ameaça directa à integração económica regional. A capacidade negocial de Carney será testada num contexto de retórica agressiva e revisionista por parte de Washington. A deterioração da relação poderá induzir uma recessão no Canadá, cuja previsão de crescimento baixou para 1,7%.

2. Segurança e Defesa Nacional
Com a guerra na Ucrânia e o aumento da projecção geoestratégica da China no Árctico, o Canadá enfrenta pressões para cumprir os compromissos da NATO, nomeadamente o investimento de 2% do PIB na defesa até 2030. A dotação orçamental de 18 mil milhões de dólares para equipamento militar é ambiciosa, mas enfrenta resistência orçamental e prioridades concorrentes.

3. Diplomacia no Médio Oriente
A política externa canadiana terá de encontrar um equilíbrio entre a pressão interna por maior solidariedade com a Palestina e a necessidade de manter relações estratégicas com Israel e os Estados Unidos. A reputação do Canadá como actor moderador poderá ser determinante na arquitectura diplomática da região.

Implicações para o Canadá e a Região

A vitória liberal posiciona o Canadá como um bastião do multilateralismo e do progressismo na América do Norte. No entanto, a dependência económica em relação aos EUA limita o seu raio de acção geopolítica. O futuro governo poderá aprofundar parcerias estratégicas com a União Europeia, o Japão e países africanos lusófonos, mas terá de gerir com mestria as fragilidades internas, sob pena de acentuar divisões estruturais que remontam à fundação da federação.

Conclusão

A ascensão de Mark Carney ao cargo de Primeiro-Ministro representa um novo ciclo na política canadiana, marcado por uma resposta vigorosa ao populismo conservador e ao unilateralismo norte-americano. Contudo, o contexto exige liderança assertiva, diplomacia sofisticada e reformas estruturais profundas. O tempo dirá se esta vitória assinala uma renovação liberal ou apenas adia crises que permanecem latentes.

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