Nos últimos anos, Angola tem experimentado avanços significativos na consolidação da democracia e no fortalecimento da descentralização administrativa, especialmente com o processo de implementação das autarquias locais. Neste cenário, as administrações municipais enfrentam o desafio de modernizar a sua actuação e redefinir as suas formas de se comunicar com os cidadãos. Surge, então, uma ferramenta ainda pouco explorada nos círculos da gestão pública local: o marketing político aplicado à Administração Municipal.
É necessário esclarecer, desde logo, que o marketing político não é uma técnica de manipulação ou de vaidade institucional, mas sim uma ciência aplicada à gestão estratégica da imagem, da comunicação e do relacionamento entre o poder público e os cidadãos. Como salienta Kotler e Kotler (1999), “o marketing político bem orientado é aquele que serve à democracia, proporcionando um canal eficaz de comunicação entre governantes e governados”. Quando utilizado com ética e responsabilidade, torna-se um instrumento essencial para a transparência, legitimidade e eficiência da administração pública.
1. O que é, afinal, o marketing político municipal?
Marketing político, no contexto da administração pública local, é o conjunto de acções comunicacionais e estratégicas que visam posicionar a imagem da instituição junto da sociedade, fortalecer o vínculo com os munícipes e valorizar as políticas públicas desenvolvidas. Ele permite que o governo local comunique não apenas o que faz, mas por que faz, para quem faz e com que impacto social.
Segundo Reinaldo Limongi (2009), “a comunicação política eficaz é aquela que transforma a acção administrativa em narrativa compreensível e legitimadora da autoridade pública”. É importante aqui distinguir dois conceitos muitas vezes confundidos: marketing eleitoral e marketing político. O primeiro é usado para conquistar votos e tem duração limitada ao período eleitoral. Já o segundo é permanente, orientado para construir e manter relações sólidas de confiança entre a administração e a população.
2. Diagnóstico: o ponto de partida da estratégia
Nenhuma estratégia de marketing político se inicia sem uma análise aprofundada do território e da população local. É fundamental conhecer os principais grupos sociais existentes no município, os líderes comunitários, as instituições locais, os canais informais de comunicação, os problemas mais sentidos pela população e a percepção que os cidadãos têm da administração municipal.
De acordo com Kunsch (2003), “a comunicação eficaz na administração pública começa com o conhecimento profundo dos seus públicos, seus valores, culturas e expectativas”. Esse diagnóstico pode ser feito através de pesquisas qualitativas e quantitativas, com o objectivo de compreender o que os munícipes valorizam, temem, esperam e criticam. É nesse retrato real que se desenha o plano de comunicação.
3. Definição da identidade institucional e das mensagens-chave
Uma administração sem identidade clara comunica de forma confusa e descoordenada. Por isso, o passo seguinte é definir a identidade da Administração Municipal: quais os seus valores, missão, visão de futuro e compromissos com a população?
Como destaca Castells (2009), “num mundo em rede, a identidade institucional é um activo estratégico fundamental para os governos manterem legitimidade e relevância”. Devem-se construir mensagens-chave coerentes com essa identidade — simples, objectivas e facilmente assimiláveis pela população.
4. Planeamento dos canais de comunicação
Num país com desafios de inclusão digital e desigualdade de acesso à informação, como Angola, a escolha dos canais de comunicação deve ser estratégica e plural.
Segundo Habermas (1989), “a esfera pública é fortalecida quando o discurso político se abre a diferentes meios e formatos, ajustando-se à diversidade do público”. As administrações municipais devem usar uma combinação de meios tradicionais e digitais, garantindo que a informação circula, é compreendida e inspira acção colectiva.
5. Mostrar resultados e não apenas promessas
Muitas administrações cometem o erro de comunicar apenas intenções, esquecendo de valorizar os resultados alcançados. Mostrar obras realizadas, acções concretas e mudanças perceptíveis não é apenas autoelogio — é transparência e prestação de contas.
Segundo Pinho (2008), “prestar contas é parte indissociável do acto de governar democraticamente”. Cada acção deve vir acompanhada de dados claros sobre os beneficiários, custos e impactos sociais, reforçando a credibilidade institucional.
6. Envolver os cidadãos como parceiros e não como expectadores
O marketing político não deve ser uma via de mão única. Pelo contrário, deve promover a escuta activa, a consulta pública e o diálogo permanente com os cidadãos.
De acordo com Arnstein (1969), “a participação cidadã é o verdadeiro termómetro da democracia, e os governos que a promovem tornam-se mais legítimos e eficazes”. Plataformas digitais, audiências públicas e fóruns comunitários devem ser estimulados para transformar o cidadão em coautor das políticas públicas.
7. Formar os quadros da administração municipal em comunicação pública
Uma boa estratégia de marketing político só é eficaz quando os funcionários públicos partilham da cultura institucional e sabem representar a imagem do Estado local.
Como defende Grunig (1992), “a comunicação organizacional eficaz depende da preparação dos seus actores internos, que precisam ser embaixadores da imagem institucional”. Isso exige formação contínua em comunicação institucional, escuta comunitária e atendimento ao público.
8. Monitoramento, avaliação e adaptação permanente
Nenhuma estratégia deve ser engessada. O marketing político precisa de ser monitorado e ajustado constantemente, com base em indicadores claros e metas definidas.
Segundo Drucker (1999), “o que não se mede, não se melhora”. Indicadores como alcance de mensagens, reputação pública e feedback dos cidadãos são essenciais para garantir que a comunicação esteja alinhada com os objectivos da governação.
Conclusão: comunicar é governar
No século XXI, a qualidade de uma administração não se mede apenas pela quantidade de obras, mas também pela forma como se relaciona com o seu povo. Uma governação que não comunica, que não escuta, que não valoriza a sua própria imagem institucional, corre o risco de perder legitimidade, confiança e autoridade moral.
Como sintetiza Castells (2009), “o poder é exercido por meio da comunicação e a comunicação é a arena onde se disputa o poder”. O marketing político, aplicado com ética, estratégia e foco no bem comum, é um instrumento de empoderamento cívico e de fortalecimento da governação local. Porque, no fim das contas, quem não comunica bem, não governa bem.
O conteúdo Administrações Municipais em Angola: trabalham muito, mas comunicam mal aparece primeiro em Correio da Kianda – Notícias de Angola.
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