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Análise político-estratégica sobre Ibrahim Traoré: tentativas de golpe em Burkina Faso e o posicionamento dos EUA e líderes africanos

Ibrahim Traoré, presidente interino de Burkina Faso, desde o golpe de Estado de Setembro de 2022, tornou-se uma figura central na política do Sahel, marcada por instabilidade, violência jihadista e tensões geopolíticas. A sua ascensão ao poder, destituindo Paul-Henri Damiba, foi justificada pela incapacidade do antecessor em conter a insurgência jihadista, que controla cerca de 40% do território burquinabê. Contudo, a governação de Traoré, caracterizada por um discurso pan-africanista, anti-imperialista e pela reorientação das alianças internacionais, tem gerado controvérsia, culminando em sucessivas tentativas de golpe e críticas de potências ocidentais, nomeadamente os Estados Unidos, bem como de alguns líderes africanos. Esta análise examina os últimos acontecimentos envolvendo Traoré, as tentativas de golpe, o posicionamento dos EUA e de líderes africanos, e as motivações para a sua potencial destituição.

Contexto Recente e Tentativas de Golpe

Em 22 de Abril de 2025, o governo militar burquinabê anunciou a neutralização de um “grande complô” para derrubar Traoré, planeado para 16 de abril, com um ataque à presidência. A conspiração, segundo o Ministro da Segurança, Mahamadou Sana, envolveu ex-oficiais militares baseados na Costa do Marfim, como Joanny Compaoré e Abdramane Barry, e foi alegadamente coordenada a partir de Abidjan. Esta não é a primeira tentativa de desestabilização: desde 2022, Traoré enfrentou pelo menos quatro alegadas conspirações, incluindo uma em setembro de 2023, que resultou na detenção de quatro oficiais. Estas tentativas refletem a fragilidade interna do regime, agravada por divisões no seio das forças armadas e pela insatisfação com a persistente insegurança.

A narrativa oficial aponta para a ingerência externa, nomeadamente de potências ocidentais e países vizinhos alinhados com estas, como a Costa do Marfim. Traoré tem acusado repetidamente a França e os EUA de orquestrarem esforços para desestabilizar o seu governo, uma retórica que ressoa com o legado de Thomas Sankara, assassinado em 1987 num golpe com alegado apoio ocidental. Postagens no X reforçam esta perceção, sugerindo que a CIA e a França veem Traoré como uma ameaça ao controlo ocidental dos recursos burquinabês, como ouro e níquel.

Posicionamento dos Estados Unidos

Os EUA têm adotado uma postura crítica face a Traoré, refletida em declarações de figuras como o General Michael Langley, comandante do AFRICOM. Em abril de 2025, Langley acusou Traoré de desviar receitas de ouro para consolidar o seu poder, uma alegação rejeitada por Burkina Faso e por aliados regionais, como o partido EFF da África do Sul. Esta crítica insere-se numa estratégia mais ampla de contenção da influência de líderes anti-ocidentais no Sahel, especialmente após a expulsão de tropas francesas e a aproximação de Burkina Faso com a Rússia.

A hostilidade dos EUA é motivada por fatores geopolíticos e económicos. Primeiro, a reorientação de Burkina Faso para parcerias com a Rússia e a China desafia a hegemonia ocidental na região, num momento em que o Sahel é palco de uma nova “guerra fria” por influência e recursos. Segundo, as políticas de Traoré, como a nacionalização parcial de minas de ouro, ameaçam os interesses de empresas ocidentais. Terceiro, a formação da Aliança dos Estados do Sahel (AES), com Mali e Níger, e a saída destes países da CEDEAO, reduz a influência de organizações regionais alinhadas com o Ocidente, como a CEDEAO, que os EUA apoiam.

Posicionamento dos Líderes Africanos

O posicionamento dos líderes africanos face a Traoré é ambíguo, refletindo divisões ideológicas e interesses nacionais. Líderes de países do Sahel, como Assimi Goïta (Mali) e Abdourahamane Tchiani (Níger), apoiam Traoré, partilhando a sua visão anti-imperialista e a aposta em parcerias com a Rússia. Esta solidariedade é visível na AES, que visa contrabalançar a influência ocidental. Contudo, líderes de países alinhados com o Ocidente, como Alassane Ouattara da Costa do Marfim, são abertamente hostis. A recusa de Ouattara em extraditar opositores de Traoré exacerbou as tensões bilaterais, com Ouagadougou a acusar Abidjan de abrigar conspiradores.

Outros líderes africanos, especialmente da CEDEAO, condenam os golpes militares na região, incluindo o de Traoré, por ameaçarem a estabilidade regional e as normas democráticas. Esta posição é influenciada pela pressão de potências ocidentais e pela necessidade de manter a legitimidade junto de organizações internacionais. No entanto, o discurso pan-africanista de Traoré, que evoca Sankara, ressoa entre sectores da sociedade civil e juventude africana, criando um dilema para líderes que temem perder apoio popular.

Motivações para Derrubar Traoré

As motivações para destituir Traoré são multifacetadas, combinando fatores internos e externos:

1. Geopolítica e Recursos: Traoré representa uma ameaça aos interesses ocidentais ao priorizar a soberania económica e parcerias com a Rússia e a China. A sua tentativa de nacionalizar recursos, embora limitada, desafia o modelo neocolonial de exploração de matérias-primas.

2. Instabilidade Interna: A incapacidade de conter a violência jihadista, agravada por massacres como o de Barsalogho (2024), alimenta a insatisfação interna, incluindo no seio das forças armadas. A anistia a golpistas de 2015 e a conscrição de críticos, como Arouna Loure, geram tensões adicionais.

3. Autoritarismo: A extensão do governo da junta por cinco anos (maio de 2024), a proibição de protestos e a repressão de opositores atraem críticas de organizações de direitos humanos, como a FIDH, e legitimam a narrativa ocidental de que Traoré é uma ameaça à democracia.

4. Influência Regional: A liderança carismática de Traoré e o seu apelo pan-africanista inspiram movimentos anti-ocidentais noutros países, o que preocupa tanto potências externas como líderes africanos alinhados com o Ocidente. Postagens no X sugerem que a CIA teme que Traoré influencie outros líderes, potencialmente transformando África numa “superpotência” em 15 anos.

Conclusão

Ibrahim Traoré encontra-se numa encruzilhada estratégica, enfrentando pressões internas e externas que testam a resiliência do seu regime. As tentativas de golpe, como a de abril de 2025, refletem a fragilidade do seu governo, agravada pela insegurança e divisões militares. Os EUA, motivados por interesses geopolíticos e económicos, veem Traoré como uma ameaça à sua influência no Sahel, enquanto líderes africanos estão divididos entre o apoio à sua visão anti-imperialista e a condenação dos seus métodos autoritários. As motivações para o derrubar assentam na sua rejeição do modelo neocolonial, na instabilidade interna e no seu potencial para inspirar mudanças regionais. Contudo, a popularidade de Traoré entre a juventude africana e o apoio de aliados como Mali e Níger sugerem que a sua queda não será iminente, embora o futuro do seu regime dependa da capacidade de mitigar a insegurança e consolidar a unidade interna.

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