As negociações em curso em Genebra entre os Estados Unidos e a China, lideradas pelo Secretário do Tesouro norte-americano, Scott Bessent, e pelo Vice-Primeiro-Ministro chinês, He Lifeng, representam um momento crítico para a economia global, com impactos directos na trajectória económica e geopolítica de Angola. Como especialista em Relações Internacionais, esta análise avalia os possíveis desfechos das conversações, as suas implicações para o comércio global e para Angola, considerando o contexto de tensões globais, incluindo a crise Índia-Paquistão, as negociações Rússia-Ucrânia e o recente Desfile do Dia da Vitória em Moscou. O foco recai sobre os três cenários apresentados acordo parcial, impasse e escalada e as estratégias que Angola deve adoptar para navegar este cenário volátil.
Contexto Geopolítico e Económico
As negociações em Genebra visam mitigar as tarifas punitivas impostas mutuamente pelos EUA (145%) e pela China (125%), que reduziram o comércio bilateral de 660 mil milhões de dólares a níveis críticos. Estas tarifas, intensificadas pela administração Trump em 2025, reflectem uma guerra comercial que se agravou desde 2018, agora agravada por disputas sobre minerais críticos, tecnologia e cadeias de abastecimento. A ausência de progressos concretos após a reunião de sábado, conforme reportado, aumenta a incerteza num momento em que a economia global enfrenta múltiplas crises: a guerra na Ucrânia, a escalada Índia-Paquistão e a fragmentação do comércio internacional.
Geopoliticamente, as negociações são um teste à capacidade dos EUA e da China de evitar uma “nova Guerra Fria”. Os EUA, sob Trump, adoptaram uma postura proteccionista, enquanto a China, enfrentando um crescimento económico projectado em apenas 4% para 2025 (Goldman Sachs), busca preservar sua influência como principal parceiro comercial de nações como Angola. A presença de Xi Jinping no Desfile do Dia da Vitória em Moscou, dias antes, reforça a aliança sino-russa, que pode endurecer a postura de Pequim contra concessões aos EUA. Paralelamente, a crise Índia-Paquistão, com a suspensão do Tratado das Águas do Indo, consome capital diplomático de Washington, limitando sua capacidade de pressão em Genebra.
Cenários e Implicações Globais
Acordo Parcial:
Descrição: Redução das tarifas para cerca de 80%, como sugerido por Trump na Truth Social, exigiria concessões mútuas, como maior acesso ao mercado chinês para empresas americanas e relaxamento de restrições chinesas a exportações de minerais raros.
Impacto Global: Estabilizaria cadeias de abastecimento, aliviando a inflação nos EUA (onde consumidores absorvem o custo das tarifas) e impulsionando o crescimento chinês. Segundo o CEPR, um acordo poderia aumentar o comércio global em 3-5%, beneficiando sectores como electrónica e automóvel.
Implicações para Angola: Estabilização dos preços do petróleo, com a China mantendo a procura por crude angolano (60% das exportações). Maior previsibilidade económica apoiaria investimentos em infraestruturas e diversificação, como os projectos agrícolas financiados pela linha de crédito indiana de 200 milhões de dólares.
Impasse:
Descrição: A ausência de avanços, o cenário mais provável dado o historial de negociações, manteria as tarifas actuais, prolongando a incerteza.
Impacto Global: Volatilidade nos mercados financeiros, com pressão contínua sobre cadeias de abastecimento globais. O CEPR estima uma contracção de 8,5% no comércio global em caso de impasse prolongado, afectando países dependentes de exportações, como Angola.
Implicações para Angola: Volatilidade nos preços do petróleo, dificultando o planeamento fiscal e a diversificação económica. Projectos de energia renovável, dependentes de minerais chineses, enfrentariam atrasos devido a custos elevados.
Escalada:
Descrição: Novas restrições, como limites chineses a exportações de minerais críticos (ex.: lítio, cobalto), poderiam ser retaliados com sanções americanas a sectores tecnológicos chineses, aprofundando a fragmentação económica.
Impacto Global: Uma “desglobalização” acelerada, com cadeias de abastecimento regionais substituindo o comércio global. O impacto económico seria severo, com recessão em economias dependentes de exportações e inflação global persistente.
Implicações para Angola: Queda na procura chinesa por petróleo, devido à desaceleração económica, reduziria as receitas fiscais, comprometendo a capacidade de financiar a dívida externa e projectos de diversificação. O encarecimento de minerais críticos prejudicaria iniciativas de transição energética.
Angola no Panorama Internacional
Angola, cuja economia depende do petróleo para 90% das exportações, é altamente vulnerável às flutuações do comércio global. A China, principal compradora do crude angolano, representa 60% do mercado de exportação, enquanto parcerias recentes, como a linha de crédito indiana de 200 milhões de dólares para modernizar as Forças Armadas Angolanas (FAA), reflectem esforços de diversificação de aliados. No entanto, a dependência petrolífera e a dívida externa limitam a capacidade de Luanda de absorver choques externos, como os que podem resultar do impasse ou escalada em Genebra.
A nível geopolítico, Angola mantém uma postura pragmática, equilibrando relações com a China, Rússia, Índia e potências ocidentais. A presença de líderes africanos no Desfile do Dia da Vitória em Moscou e o interesse na proposta de negociações Rússia-Ucrânia em Istambul demonstram a relevância de Luanda no Sul Global. Contudo, a crise Índia-Paquistão, que afecta a estabilidade de um parceiro estratégico como a Índia, sublinha a necessidade de Angola diversificar mercados para além da Ásia.
Estratégias para Angola
Diversificação Económica: Intensificar investimentos em agricultura, mineração (ex.: diamantes, minerais raros) e turismo, aproveitando parcerias como a com a Índia para tecnologia e formação. O Fundo Soberano de Angola deve priorizar sectores não-petrolíferos.
Exploração de Mercados Alternativos: Fortalecer laços comerciais com a Europa (ex.: Portugal, Alemanha) e a América Latina (ex.: Brasil), reduzindo a dependência da China. A adesão a acordos regionais, como a Zona de Comércio Livre Continental Africana (AfCFTA), pode abrir novos mercados.
Transição Energética: Mitigar o impacto de restrições a minerais críticos, desenvolvendo parcerias com países africanos ricos em lítio e cobalto, como a RDC, para sustentar projectos de energia renovável.
Diplomacia Activa: Apoiar esforços de desescalada global, como as negociações em Genebra e Istambul, para promover estabilidade nos mercados energéticos. Angola pode posicionar-se como mediadora na SADC, reforçando sua liderança regional.
Conclusão
As negociações EUA-China em Genebra são um divisor de águas para a economia global, com implicações profundas para Angola. Um acordo parcial estabilizaria os preços do petróleo e apoiaria a diversificação económica, enquanto um impasse ou escalada agravaria a volatilidade, comprometendo as receitas fiscais e os projectos de desenvolvimento. Num contexto de tensões globais da guerra na Ucrânia à crise Índia-Paquistão Angola deve adoptar uma estratégia proactiva, diversificando sua economia e mercados, enquanto reforça sua diplomacia no Sul Global. A vigilância aos resultados de Genebra é crucial, pois ditarão o ritmo do crescimento económico angolano e a estabilidade do sistema internacional.
O conteúdo As negociações EUA-China em Genebra e possíveis implicações para Angola aparece primeiro em Correio da Kianda – Notícias de Angola.
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