O conflito entre a Rússia e a Ucrânia, iniciado com a invasão russa em Fevereiro de 2022, permanece como um dos maiores desafios à estabilidade global, com impactos profundos na segurança europeia, na economia mundial e na ordem internacional. A recente declaração do vice-presidente dos Estados Unidos, JD Vance, expressando optimismo sobre um possível desfecho pacífico, com base em supostos avanços em negociações bilaterais nas últimas 24 horas, reflecte a intensificação dos esforços diplomáticos da administração Trump. Contudo, este optimismo deve ser analisado com cautela, considerando as complexidades do conflito, as tensões entre as partes envolvidas e o papel ambíguo dos EUA como mediador. Este artigo avalia as implicações destas negociações, os desafios à mediação americana e as perspectivas de uma paz duradoura.
Contexto do Conflito e os Custos da Guerra
A guerra Rússia–Ucrânia, que se aproxima do seu terceiro aniversário, já resultou em perdas humanas devastadoras, com estimativas de centenas de milhares de mortos e feridos, incluindo civis, e milhões de deslocados. A Ucrânia sofreu danos massivos em infraestruturas críticas, enquanto a Rússia enfrenta sanções económicas sem precedentes, embora tenha adaptado a sua economia com parcerias alternativas, nomeadamente com a China e a Coreia do Norte. Ataques recentes, como os mísseis balísticos russos que mataram 34 pessoas em Sumy, no norte da Ucrânia, em abril de 2025, e os bombardeamentos em Kharkiv e Donetsk, sublinham a continuidade da violência, apesar de esforços diplomáticos.
A Ucrânia, fortemente dependente do apoio militar e financeiro ocidental, enfrenta dificuldades crescentes. A suspensão temporária da assistência militar americana, anunciada por Trump em março de 2025, revelou a vulnerabilidade de Kiev face à pressão diplomática de Washington. Por outro lado, a Rússia mantém uma postura intransigente, rejeitando “meias-medidas” e insistindo no controlo de territórios ocupados, como as quatro regiões anexadas em 2022.
O Optimismo de JD Vance e as Negociações Recentes
A declaração de JD Vance, proferida em 18 de abril de 2025, durante um encontro com a primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, em Roma, destaca supostos avanços em negociações bilaterais entre autoridades russas e ucranianas nas últimas 24 horas. Embora Vance tenha evitado divulgar detalhes, a sua retórica otimista contrasta com a posição do secretário de Estado, Marco Rubio, que horas antes afirmou que Trump poderia abandonar as tentativas de mediação caso não houvesse progressos rápidos. Esta divergência sugere uma estratégia de pressão dupla: Vance projeta esperança para manter o ímpeto diplomático, enquanto Rubio sinaliza a impaciência de Washington.
As negociações referidas por Vance seguem uma série de encontros mediados pelos EUA, nomeadamente em Riade e Jeddah, na Arábia Saudita, que se tornaram um palco improvável, mas estratégico, para discussões de paz. Em março de 2025, a Ucrânia aceitou uma proposta americana de cessar-fogo de 30 dias, acompanhada da retoma da assistência militar e de inteligência dos EUA. Contudo, a exclusão inicial da Ucrânia de algumas rondas negociais, como as conversações entre Trump e Putin em fevereiro de 2025, gerou tensões com Kiev e críticas de aliados europeus, que temem um acordo que favoreça Moscovo.
O Papel dos EUA como Mediador
A administração Trump posicionou-se como mediador central, com o presidente a afirmar repetidamente a sua capacidade de “acabar com a guerra em 24 horas”. Esta retórica reflete a política “América em Primeiro Lugar”, que combina pressão sobre aliados e adversários com a busca por vitórias diplomáticas de alto perfil. A abordagem de Trump incluiu contactos diretos com Vladimir Putin, como a chamada telefónica de 90 minutos em fevereiro de 2025, e reuniões com Volodymyr Zelensky, embora marcadas por tensões públicas, como o confronto no Salão Oval em 28 de fevereiro de 2025.
No entanto, a mediação americana enfrenta obstáculos significativos. Primeiro, a suspensão intermitente da ajuda militar à Ucrânia, usada como alavanca para forçar concessões de Zelensky, minou a confiança de Kiev. Segundo, a exclusão da Ucrânia e da Europa de algumas negociações alimentou receios de que os EUA priorizem um acordo rápido em detrimento de uma paz justa. Terceiro, a retórica de Trump e Vance, que questiona a adesão da Ucrânia à NATO e a restauração das fronteiras pré-2014, alinha-se parcialmente com as exigências russas, levantando dúvidas sobre a imparcialidade de Washington.
Desafios Regionais e Internacionais
A guerra Rússia–Ucrânia tem implicações que transcendem o conflito bilateral. A Europa, alarmada com a possibilidade de uma redução do apoio americano, intensificou os gastos em defesa, com países como a Alemanha, França e Reino Unido a liderarem esforços para reforçar a segurança continental. A proposta de uma “coalizão dos dispostos” para enviar forças de paz à Ucrânia, liderada pelo Reino Unido e pela França, enfrenta resistências, como a da Polónia, que prioriza a sua própria defesa.
Por outro lado, a Rússia aproveita as divisões ocidentais para consolidar a sua posição. O Kremlin, embora aberto a negociações, mantém objetivos maximalistas, incluindo a “desmilitarização” e “desnazificação” da Ucrânia, além do controlo de territórios ocupados. A parceria com a Coreia do Norte, que inclui apoio militar e reabilitação de soldados russos, reforça a capacidade de Moscovo para sustentar o esforço de Guerra.
Crítica à Estratégia Americana
O otimismo de JD Vance, embora bem-vindo num contexto de violência contínua, parece prematuro face à ausência de progressos concretos e à fragilidade dos cessar-fogos anteriores. A abordagem de Trump, centrada em negociações bilaterais de alto nível, desconsidera a necessidade de incluir a Ucrânia como parceiro de pleno direito, conforme reiterado por Zelensky: “Não pode haver negociações sobre a Ucrânia sem a Ucrânia”. Além disso, a pressão sobre Kiev para ceder recursos minerais estratégicos, como terras raras e lítio, em troca de apoio militar, levanta questões éticas e estratégicas, transformando a Ucrânia numa potencial “colónia económica” americana.
Para que a mediação dos EUA seja eficaz, é essencial adotar uma postura mais inclusiva, que envolva a Europa e respeite a soberania ucraniana. A ameaça de sanções adicionais à Rússia, como sugerido por Trump em março de 2025, pode ser ineficaz, dado que Moscovo já opera sob um regime de sanções massivas e encontrou formas de as contornar. Uma paz duradoura exige compromissos realistas, incluindo garantias de segurança para a Ucrânia e um quadro multilateral que envolva a ONU ou mediadores neutros, como a Arábia Saudita.
Conclusão
A declaração de JD Vance sobre avanços nas negociações Rússia–Ucrânia reflete a ambição da administração Trump de alcançar uma vitória diplomática num conflito que moldará a ordem global nas próximas décadas. Contudo, o otimismo deve ser temperado pela realidade de um conflito profundamente enraizado, com partes inflexíveis e interesses geopolíticos complexos. A mediação americana, embora necessária, enfrenta o desafio de equilibrar pressão diplomática com legitimidade e imparcialidade. Sem a inclusão plena da Ucrânia e o apoio coordenado da Europa, qualquer acordo corre o risco de ser frágil e insustentável. A guerra na Ucrânia não é apenas uma luta por território, mas um teste à capacidade do sistema internacional de resolver conflitos num mundo cada vez mais polarizado.
O conteúdo Guerra Rússia–Ucrânia: o optimismo de JD Vance e os desafios da diplomacia americana aparece primeiro em Correio da Kianda – Notícias de Angola.
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